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UFPR é condenada a ressarcir e indenizar candidato de concurso não realizado
Decisão do 3º Juizado Especial Federal do Rio de Janeiro reconheceu a responsabilidade da banca que cancelou certame com apenas 06 horas de antecedência
Um candidato inscrito no concurso da Polícia Civil do Paraná foi vitorioso em ação para reparação de danos materiais e morais contra a Universidade Federal do Paraná, organizadora do certame. Em fevereiro deste ano, a prova para preenchimento de 400 vagas nos cargos de delegado, papiloscopista e investigador foi cancelada com menos de sete horas de antecedência a sua realização.
Com prerrogativa no artigo 37, § 6º da Constituição Federal, o autor, que mora no Rio de Janeiro, pleiteou contra a Universidade e contra o Estado pelo ressarcimento dos valores gastos com transporte, alimentação e hospedagem para a realização da prova pertinente ao PCPR/2020 – Edital nº 002/202.
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
A defesa das instituições suscitou questões contratuais e materiais, à exemplo do agravamento da pandemia ocorrido naquele mês, que levou a decisão de cancelar o certame para preservar a integridade física dos participantes e manter a lisura e o tratamento isonômico para todos os candidatos.
Edital faz lei entre as partes
Para decidir a lide, o magistrado recorreu a item do Edital em questão que previa explicitamente a comunicação aos candidatos com antecedência de 72 horas em caso de alteração na data da realização de qualquer uma das fases ou etapas do concurso.
“O Edital é lei entre as partes. (...) Por mais que a organizadora do concurso apresente diversos argumentos para justificar o adiamento da aplicação da prova para outra data, nada embasa sua conduta de somente emitir comunicado no dia aprazado, qual seja, 21/02/2021, poucas horas antes do início da avaliação, ou seja, este estava previsto para 13h30 e o aviso foi inserido na página eletrônica da ré às 05:42”, proferiu Marco Falcão Cristineli, Juiz Federal, na sentença.
Responsabilidade civil do Estado e da banca organizadora
Consta da decisão que o cancelamento de provas de concurso público gera a responsabilidade objetiva da entidade organizadora de restituir aos candidatos as despesas com taxa de inscrição e deslocamento para cidades diversas daquelas em que mantenham domicílio. Ao Estado, cabe somente a responsabilidade subsidiária, no caso de a instituição organizadora do certame se tornar insolvente.
Neste sentido, o Estado responde subsidiariamente por danos materiais causados a candidatos em concurso público organizado por pessoa jurídica de direito privado, quando os exames são cancelados.
Da negligência da entidade responsável pelo certame
A decisão avançou ao julgar também o descaso com os concurseiros observado no caso e suscitado pelo autor em sua inicial.
“No caso em tela, já era presumível que aprova não seria aplicada com observação de todas as regras de biossegurança. Constata-se que a ré agiu com negligência ao não informar o adiamento do certame em data pretérita. Por mais que não haja necessidade de se comprovar a culpa na responsabilidade objetiva, tal dado é notório nos fatos constantes nos autos”, deliberou o julgador.
Entendo que a parte autora foi capaz de comprovar a existência dos elementos da responsabilidade civil objetiva, foi condenada a banca a indenizar o candidato material e moralmente.
Teoria do desvio produtivo do consumidor foi aplicada na decisão
Tendo em vista o dessabor da surpresa com o cancelamento da prova e o deslocamento descabido da parte autora até outro estado da Federação, o que não teria ocorrido caso a banca tivesse atentado ao disposto no edital, restou presumido o dano moral.
O Juiz ainda considerou a teoria do desvio produtivo do consumidor, que desnecessariamente viajou para outro estado para realizar a prova. Para tal análise, recapitulou o voto da Ministra Nancy Andrighi em julgado de 05/02/2019, o qual versa sobre possibilidade de compensação por danos morais em casos flagrantes de desperdício de tempo útil que acarretam violação injusta e intolerável ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos.
Ref.: 5034002-04.2021.4.02.5101/RJ
Artigo escrito por Evandro Oliveira, OAB/RJ 22.4710, advogado com especialização em responsabilidade civil, que atua pela Teixeira, Oliveira, Tuzi Advogados no estado do Rio de Janeiro.